Ver Brokeback Mountain pela segunda vez é, antes de tudo, uma experiência estética. As paisagens são belíssimas, a natureza exuberante. Poder prestar atenção em cada detalhe daquela montanha, dos rios e da neve preenche a nossa alma com a beleza, com a perfeição.
Experiência estética também é prestar atenção à trilha sonora, com cuidado. Desde “Brokeback Mountain” até a música de Bob Dylan, “He was a friend of mine”, cantada por Willie Nelson enquanto passam os letreiros finais – aqueles que na sessão de domingo, cheia, a gente nem vê, pois todo o cinema se levanta na nossa frente. É uma trilha sonora perfeita para o filme. Triste e belíssima.
E ver Brokeback Mountain pela segunda vez é, outra vez, mergulhar numa belíssima e triste história de amor e de impossibidades.
É ver que há muito pouco tempo atrás, lá pelos anos 60/80, dois homens viverem um amor era algo quase impossível. Não que hoje seja absolutamente permitido... mas é bem mais fácil. A cena das duas crianças sendo levadas pelo pai para ver o cara assassinado – que exemplo queria mostrar o pai ao fazer isso?
As duas mulheres – que representação das mulheres o diretor consegue fazer. Uma que descobre que o marido gosta de um cara, se separa dele e troca a vida medíocre que levava com ele para outra vida medíocre com outro marido – seu chefe no supermercado...
E a mulher de Jack, Lureen, que é decidida e faz o que quer de sua vida – resolve transar com o cowboy bonito – e o próprio Jack explicita isso, ao dizer “rápido ou não, estou gostando da direção que você está dando” – é ela que quer, é ela que se casa com ele, e fica o tempo todo cuidando dos negócios – o papel do homem? Vive um mundo de irrealidades, e a própria versão contada por ela ao final mostra isso – pra que se preocupar e enfrentar a realidade?
Triste papel o das mulheres naquela época também, tão bem mostrado pelo diretor. Mulheres coadjuvantes nessa história, e coadjuvantes também na vida de seus maridos. E olhem, isso não foi há tanto tempo assim.
É ver mais uma vez o cruel diálogo entre Ennis e o pai de Jack – e a cumplicidade e a tensão entre o pai e a mãe do Jack – a tensão na forma com a qual cada um dos dois aceitava a história do filho e o que Ennis representava para Jack, e como o viam.
E por fim, ver Brokeback Mountain pela segunda vez é ver a história de amor de dois homens, história que me faz chorar, história que mostra a impossibilidade que as pessoas se impõem em sua vida. Ver a perda, e ver como não percebemos que temos que viver as histórias enquanto estamos vivos. Ennis descobriu isso tarde demais.
É ver a transformação de Jack num homem que, ao mesmo tempo que consegue enfrentar seu sogro, consegue tomar a iniciativa mais dolorosa de sua vida .....
É ver Ennis Del Mar não conseguindo viver nada em sua vida – nem seu amor por Jack, nem sua relação com qualquer mulher – ele se anula, ele é o nada – e Jack é o culpado de tudo o que ele vive, como ele próprio admite – o culpado ou a única saída que ele tem, são com ele os únicos momentos em que ele se sente vivo...
É esse mesmo Ennis tendo um momento de ciúmes na vida, quando fala do México. Tipo assim, o primeiro momento em que ele quer lutar pelo que ama. Mesmo que esse amor seja algo que deixe o outro totalmente sem possibilidade de viver.
É ver dois homens belíssimos, Jack Gyllenhall e Heath Ledger – também, porque não, uma experiência estética? E um filme que me tocou muito. Deu vontade de ler o conto que deu origem ao filme.
P.S. - Graças a meu amigo Cris F., consegui o texto do conto. Também é dele um dos mais belos comentários sobre o filme, que transcrevo: "Acho que este é o filme mais tocante que assisti em anos e anos. Sai da sala de cinema triste, com olhos cheios de lágrimas. Acima de tudo um filme de amor. Difícil aparecer em 2006 um filme melhor que este".